Entre as conquistas do Modernismo brasileiro conta-se a valorização do cotidiano que, para os escritores mineiros, se associou ao que se convencionou chamar de ‘mineiridade’. Um selo que situa tantos nossos poetas quanto os ficcionistas entre duas noções conflitantes: a “cabeça baixa” e o “sentimento do mundo” drummondianos, melhor dizendo, entre o retraimento e o universalismo.
Podem se extrair essa e outras constatações da leitura
do trabalho de Ivan Marques intitulado Cenas
de um modernismo de província (São
Paulo: Editora 34, 2011, 271 p.), excelente ensaio sobre o grupo do “Estrela” 1, que nos anos de
1925/26 ‘agitou’ Belo Horizonte com a publicação de A Revista. Carlos Drummond de
Andrade, João Alphonsus, Pedro Nava, Emílio Moura, Cyro dos Anjos e outros
faziam parte desse grupo e dessa revista da qual saíram três números que
marcaram bem sua passagem.
Em Minas, houve mais três publicações: Montanha, Electrica e Verde.
A primeira, da cidade de Ubá, e a segunda, de Itanhandu, tiveram existência
muito efêmera e pouca repercussão, mas Verde,
de Cataguases, tornou-se uma das mais conhecidas variantes do Modernismo no
interior do país, seja pelos seis números editados, seja pela significativa
contribuição às nossas letras.
Por aí se vê que Minas exerceu um múltiplo papel na
produção e no diálogo modernista da época.
Na sua Cenas
de um modernismo de província, Ivan Marques, porém, cita apenas Verde e lhe dedica quase um subcapítulo,
destacando a figura de Ascânio Lopes.
No primeiro capítulo Marques salienta a importância do
modernismo mineiro, dentro do qual analisa a estrutura e a evolução do grupo do
“Estrela”. Nas demais partes dedica-se à interpretação da trajetória e obra de
Drummond, Emílio Moura, João Alphonsus e Cyro dos Anjos, em avaliações pertinentes
e valiosas para interessados no fenômeno “Minas”, esse imenso celeiro de
valores para o cenário nacional.
Cito um fragmento: “Embora estimulado pelos
acontecimentos de São Paulo, o modernismo teria conhecido em Minas uma dinâmica
própria, ou melhor, um ponto de equilíbrio em que se combinavam a ousadia das
inovações e a fidelidade ao passado literário: ‘curiosa modernidade mineira’,
conclui Antonio Candido”.
Esta obra de Ivan Marques é uma leitura imprescindível
para se conhecer o espírito mineiro que se aventurou, nos idos de 1920,
carregado de todas as suas nuances e idiossincrasias, a colaborar na reforma da
literatura brasileira que se fazia na época. O que realizou com muito êxito.